Penas depois da Morte
Livro: Conversa Firme - 3
Cornélio Pires & Francisco Cândido Xavier
Assunto difícil este,
Meu caro Gino Salerno,
Comentarmos de outra vida
O que existe no inferno.
Em tempos que já se foram,
Eu também pensava assim:
O inferno, depois da morte,
Seria fogo sem fim.
Mais tarde, a luta foi crescendo,
Olvidei o mundo antigo
Mas nunca larguei de todo
De certo modo o castigo
Acreditava que a morte
Depois de nossos fiascos,
Colocasse à nossa frente,
Algemas, troncos, carrascos...
Sofrimentos em verdade,
Não faltam no Mais Além:
Impedimentos, prisões
E adversários do bem.
Espíritos infelizes
Inventam charcos e dores
Criando painel imenso
De “trevas exteriores”
No entanto, por mais abismos
A que a pessoa se lança,
A lei de Deus determina
Que a ninguém falte esperança.
Tal qual sabemos na Terra,
Para além da sepultura,
O que se tem no caminho
É aquilo que se procura.
A culpa é desequilíbrio
Sob impulsos insensatos,
E a mente resguarda ao vivo,
A conta de nossos atos.
O inferno, por isto mesmo,
Seja ele o mais atroz,
É o conflito dos conflitos
Que surgem dentro de nós.
Cada qual transporta em si
- Do mais crente ao mais ateu,-
O resultado infalível
De tudo quanto escolheu.
Por simples anotações
E ensinamentos gerais,
Recordarei com você
Vários casos infernais.
Você lembra a sovinice
Do fazendeiro Adão Noce,
Desencarnado, agarrou-se
Aos sofrimentos da posse.
Querendo vingar o filho
Enlouqueceu Dona França,
Mas vive depois da morte
Atarracada à vingança.
Morreu pisando nos outros,
Nhô Lino do Lumaréu,
Sem corpo, mora no barro
Mas pensa que está no Céu .
Finou-se atracado à gula
O nosso Antônio Lodi;
Agora, enxerga a comida,
Quer tocá-la, mas não pode.
Foi-se a tóxicos violentos,
Juquita de Dona Altina;
No Além, anda alucinado,
Reclamando cocaína.
De tanto excesso em bebida
Morreu Nhô Nico de Alfafa;
Hoje, vê tudo o que encontra,
Sob a forma de garrafa.
Morreu Nhô Juca, usuário
No Roçado da Moenda;
Mesmo assim, vive ligado
Nas porteiras da fazenda.
Ódio e briga? Escuta esta:
Desencarnado, o João Fava
Foi chamado a proteger
O genro que detestava.
O assunto é isto, meu caro,
Sem engano e sem “talvez”,
Só se recolhe da morte
A vida que a gente fez.
Céu, inferno e purgatório,
Sejam daí ou daqui,
Cada pessoa carrega
O que buscou para si.
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